terça-feira, 22 de março de 2016

Desserviço da Transerp para os ciclistas

Pedalar em Ribeirão Preto é algo apenas para os fortes. Uma cidade que possui uma das maiores frotas de veículos do Brasil e que investe muito pouco em estrutura cicloviária, apenas os ciclistas que realmente precisam se aventurariam a disputar espaço com os carros e motos na cidade. Sempre que posso eu posto aqui no blog ou na página no Facebook os apuros que passo no dia a dia. O Cira do canal Radicalmente Cira mostra através de seus vídeos as dificuldades de pedalar pelas ruas de Ribeirão.

Mas e quando o poder público, alem de não dar incentivo ao uso da bicicleta, tenta prejudicar o seu uso? Foi o que aconteceu ontem na matéria da revista Revide (21/03/16). A Transerp alegou que existe a possibilidade de um projeto de lei que obrigue os ciclistas ribeirãopretanos de emplacarem suas bicicletas!

Foto via: Vá de Bike
Ler um absurdo deste logo apos quase ser morto por motoristas e motoqueiros irresponsáveis, ruas esburacadas e total ausência de ciclovias na cidade, é um verdadeiro tapa na cara! E o mais revoltante, tal projeto é defendido em partes pelo atleta Danilo Terra, um dos maiores nomes do ciclismo ribeirãopretano. Mesmo com o argumento de "o emplacamento ajudaria na redução do número de roubos", ele simplesmente não resolverá o problema! E vou ilustrar abaixo alguns motivos:

Protesto de ciclistas por mais respeito no trânsito
Foto via: Folha Região
Ciclovia Via Norte com mato em sua extensão
Foto via: Jornal A Cidade
  1. Fiscalização: a Transerp mal consegue fiscalizar as infrações cometidas por motoristas e motoqueiros de Ribeirão. Acham mesmo que os marronzinhos irão ficar parando bicicleta que não tenha placa e fazer autuação?
  2. Poucos detalhes do projeto: não foi passada nenhuma explicação de como seriam feitos os registros; ciclistas de todas as idades deveriam fazer o emplacamento? Como ficam bicicletas para crianças? E aquelas onde a pessoa não tenha mais a nota fiscal de compra? Teriam que pagar alguma taxa? Como seriam presas as placas na bicicleta? Como seria a abordagem por parte dos marronzinhos? Pra variar, nada disso foi esclarecido.
  3. Garantias: apenas o emplacamento em si não seria satisfatório; o ciclista teria alguma vantagem? Ele teria como consultar a situação legal de sua bicicleta em caso de roubo? Como ficaria caso a pessoa venda a bicicleta? E em caso de acidentes, seria necessário dar baixa do registro?
  4. Não vai reduzir o número de roubos: visto que o sistema já se mostraria falho, acha mesmo que um bandido se intimidaria pelo fato de uma bicicleta ter uma placa? Um dispositivo que poderia ser removido facilmente e descartado? Para isso existem sites muito mais confiáveis como o Bike Registrada, onde o próprio ciclista faz um cadastro e acompanha a situação e ocorrência de bicicletas roubadas em todo o país.
  5. Cidades referência no uso da bicicleta não obrigam o emplacamento: basta ver países como a Holanda, Dinamarca e Japão; o ciclista é tratado com respeito e possui total segurança para fazer seus deslocamentos. O que o governo destes países fez? Deu estrutura. Agora imagine se todas estas bicicletas precisassem de emplacamento? Seria algo no mínimo inviável.
  6. Desestimulo ao uso da bicicleta: muitos que usam a bike como meio de transporte o fazem como alternativa ao péssimo sistema de transporte publico e a falta de recursos para manter um carro. Criando este gasto extra e a necessidade de renovação entre certos períodos, o ciclista deixa de usar a bicicleta por achar estas normas "complicadas demais". 
  7. São Paulo rejeitou um projeto parecido: a capital paulista arquivou um projeto de emplacamento de bicicletas. Vale lembrar que outras normas chegaram a ser citadas como o tipo de vestimenta usada para pedalar e até o tipo de calçado permitido!
  8. Forma de punir o ciclista: ao obrigar o ciclista a emplacar sua bicicleta, toda a responsabilidade em caso de acidentes passa para o ciclista. Isso pode abrir inúmeras brechas e interpretações na lei, até mesmo incentivando a criação de mais leis que prejudiquem o ciclista.
Resumindo: eu vejo o projeto de emplacamento de bicicletas como uma forma de desestimular o uso da bike em Ribeirão Preto. O poder público tem o dever de dar uma estrutura mínima ao ciclista, tendo em vista as muitas vantagens que a bicicleta pode ter para uma cidade. Quantas vezes eu levei fechadas e finas de motoristas e nunca encontrei um agente de trânsito para reclamar? Ou mesmo casos de ônibus que passam em alta velocidade perto de nós, muitas vezes rindo, como se isso fosse alguma forma doentia de diversão? Não Transerp, não é emplacando bicicleta que vocês irão resolver o problema. O que ajudaria a dar mais segurança para o ciclista ribeirãopretano:

Ciclofaixa devidamente sinalizada em São Paulo
Foto via: Vá de Bike
Paraciclo público em São Paulo
Foto via: Capital.sp.gov.br
Velódromo de Londres
Foto via: Globo Esporte
  1. Por em prática o plano cicloviário de Ribeirão Preto: o projeto está engavetado desde 2007 e de tempos em tempos só é discutido depois de muita insistência por parte dos ciclistas. Ribeirão tem pacos 10 km de ciclovia implantadas sem nenhuma conexão entre elas. A ciclovia Via Norte é uma das maiores da cidade mas nem por isso significa que seja adequada. Falta de guarda-corpos e iluminação, alem do dificil acesso a mesma comprometem a segurança do ciclista. Avenidas como Dom Pedro I, Francisco Junqueira e Treze de Maio possuem um fluxo razoável de bicicletas e não oferecem nenhuma segurança para tal;
  2. Falta de locais para trancar/deixar a bike: no mapa do blog, existem muitos estabelecimentos comerciais que disponibilizam espaço para o ciclista trancar sua bicicleta com segurança. Mas da parte do poder público, simplesmente tal estrutura não existe. Um exemplo é o recém inaugurado Calçadão do Centro, que mesmo diante da minha insistência com a prefeitura, não instalou nenhum paraciclo ou bicicletário nesta região. As poucas opções seriam postes ou lixeiras, isso se não estiverem já ocupadas com outra bicicleta;
  3. Falta de locais para treinos: este toque vale principalmente para os ciclistas atletas, que muitas vezes precisam treinar no anel viário, com o risco permanente de serem vítimas de assaltos. Se Ribeirão Preto está se tornando uma referência no ciclismo, acredito que já passou da hora de termos um velódromo adequado!
  4. Punição severa para motoristas infratores: nunca ouvi falar de algum motorista ribeirãopretano que tenha sido autuado por colocar a vida de um ciclista em risco. Muitos nem sequer sabem sobre a distancia de 1,5 m que devem manter do ciclista. Raramente vejo campanhas orientando os motoristas sobre o cuidado que devem ter no trânsito para as bicicletas;
  5. Orientação e aulas de formação: Concordo que muitos ciclistas de Ribeirão não respeitam as leis de trânsito (inclusive já chegue a quase me envolver em acidentes por conta destes ciclistas). Por isso a Transerp deveria criar mini-cursos de trânsito nas escolas ou mesmo para os ciclistas que já utilizam a bicicleta no dia a dia.
É realmente desanimador ver projetos como este serem discutidos. O ciclista de Ribeirão precisa ser estimulado e não punido. Precisamos de estruturas e não leis oportunistas. Menos papo político e mais papo técnico. O blog se põe totalmente contra a um projeto totalmente arbitrário como o emplacamento de bicicletas. Primeiro deem estrutura para os ciclistas!

Minha bicicleta não precisa de uma chapa com números, ela só precisa ser vista e respeitada no trânsito.

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